Especialistas e empresários dizem que é preciso criar política para setor

Objetivo é estabelecer novo papel do gasoduto Brasil-Bolívia e preço para indústria
Por Ramona Ordoñez y Bruno Rosa
RIO — Apesar do enorme potencial das reservas no Brasil, especialistas e empresas são unânimes em afirmar que o governo precisa criar uma política para o uso do gás natural e, assim, estimular o desenvolvimento de uma infraestrutura para o setor. Hoje, apenas uma pequena parte (cerca de 4%) do gás é usada como matéria-prima para a produção de fertilizantes e metanol.
— É necessário ter uma visão de integração desse gás para as indústrias. As reservas podem ser inócuas sem planejamento. Por não ter gás suficiente, o Brasil não tem conhecimento real de sua demanda. A indústria da Argentina, por exemplo, consome 50% mais gás que a brasileira — diz Marco Tavares, da consultoria Gas Energy.
Com as novas reservas, o gasoduto Brasil-Bolívia continuará em uso, mas pode ganhar um novo papel, levando o gás a regiões onde não há oferta. Cristiano Prado, gerente de Competitividade Industrial e Investimentos da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), ressalta que é importante definir o uso do combustível e oferecer incentivos às indústrias, para acelerar os investimentos. Segundo ele, para esse gás ser absorvido no mercado, é preciso planejamento.
— A política para o setor inclui ainda o preço pelo qual o governo vai ofertar esse gás. Por isso, é importante escolher os setores. Hoje, há iniciativas livres do mercado privado — diz Prado.
Com gás, Eike vai criar empresa de fertilizantes
Com o gás no Maranhão explorado pela OGX, cujo potencial é de 15 milhões de metros cúbicos por dia — metade do que o Brasil importa da Bolívia —, a EBX, de Eike Batista, vai investir em fertilizantes nitrogenados. Para isso, Eike pretende criar uma empresa só de fertilizantes no segundo semestre. Constrói ainda, via MPX, um Complexo Térmico no Maranhão para receber o gás. Em Minas Gerais, a Petra, que tem entre os sócios o BTG Pactual, também levantará uma usina térmica.
Mas o setor tem pressa. A Petra, por exemplo, só agora começa a descobrir gás na Bacia de São Francisco, cuja rodada foi feita em 2005. E a produção deve começar apenas entre 2014 e 2015. A HRT, no Norte do Brasil, também ainda está explorando as áreas.
A urgência das novas rodadas fica nítida se levar em conta que os contratos atuais de concessão terminam no fim de 2015.
— A área em exploração no Brasil vai acabar, ficar zerada no fim 2015 e início de 2016. Ou essas áreas ofertadas viram descobertas ou elas se extinguem — destaca Magda Chambriard, diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP).
Analistas ressaltam ainda que, apesar de importante, a Lei do Gás precisa ser regulamentada. Um exemplo é o uso do gasoduto da Petrobras por outras empresas. Segundo uma fonte, a HRT, por exemplo, descobriu gás na Amazônia, mas não vai conseguir usar a estrutura da estatal. Conclusão: analisa diferentes hipóteses para usar o gás.
Segundo especialistas, o gás tem diversas aplicações, como a transformação de minérios e o uso de fertilizantes nitrogenados. Hoje, lembra Tavares e Prado, o Brasil importa 80% dos fertilizantes consumidos no país:
— É possível ainda usar o gás no lugar do carvão para gerar o aço e para processar a bauxita (que faz o alumínio). Hoje, o gás não é competitivo porque não tem quantidade suficiente. A oferta de 200 milhões de metros cúbicos por dia em 2020 será um esforço muito grande justamente pela falta de política.
Nos EUA, com mais reservas, o governo já estabeleceu a parcela que vai para as novas termelétricas. Além disso, a indústria química vem ganhando impulso, com mais investimentos.

O Globo